terça-feira, 30 de junho de 2009

O JARDIM DE ALAH

letra de Fred Sommer (música de Luis Kiari)

trago no peito uma flor do sertão
um pedaço de terra batida
uma leve impressão de calor
um mormaço, uma longa ferida
um breve baião, uma voz de cantor

vim dar no Rio de favor, violão
sob o braço, a marca da lida
na pele - perdão, meu amor
meu cangaço, o Leblon me convida
e dele eu não faço pouco, eu vou...

minha guia, meu colar
coração à toa, ao léu
vou até onde o vento levar
e lamento se um dia prometi o céu
e a João Pessoa voltar
com trocentos reais no chapéu

púrpura tarde, corante das seis
arauto da noite que arde feliz
do alto o Mirante me espia a seus pés
eu enfrento seus olhos covardes, gigantes rubis

vi a mais bela musa da televisão
ao meu lado ligeira passar
um senhor bem trajado vender emoção
adoidado, e rosa amarela a quem queira cheirar

levo no corpo a cor do verão
e um traço de cada avenida
na palma da mão, cá estou
um abraço, sem mais despedidas
de alma e pão vive um bom trovador

vou me deitar ao rumor do trovão
no cansaço da moça da vida
me cabe um desvão, um suor
um colapso me apressa a partida
e quem sabe o Leblon seja o fim, seja a flor

minha guia, meu chapéu
mocassim à beira-mar
vou com as pernas urgentes de réu
inocente por vias eternas, andar
pela Delfim Moreira, pinel
e contente de nunca chegar

súbito, a lua desponta através
do palco de éter, nua atriz
se apruma e se apronta (de talco ou de giz)
novamente se despe e recua na ponta dos pés

e na Praça Cazuza eu vi um barão
carmesim de tão nobre avoar
lá vou eu como vim, trovador, violão
mocassim, rumo ao céu que recobre o Jardim de Alah

CAFÉ

letra de Fred Sommer (música de Daniel Green)

tá na ponta da língua, tá na cara
tá na pauta dos sábios, guapos locos
tá nos lábios da virgem, tá na conta
dos encontros, não falta coisa rara
e eu querendo ser óbvio como poucos
tenho sido a mais cara das afrontas
já tô rouco de rock e canto triste
ando seco de pranto e não sorrio
não me toque, não largue minha mão
não é nada, é só tudo quanto existe
é o ladrão e o ladrar do dono, é o cio
é o sono, é o penar e é o perdão

ainda sem título

letra de Fred Sommer e Pedro Barnez - que coroou recentemente a parceria com um refrão impecável! (música de Luis Kiari e Aureo Gandur)

delegado, veja bem
meu marido não sabe de nada
não faz batucada
partido não tem
devoto de Santo Expedito
desperta ao apito
do primeiro trem
batalha sábado e domingo
não faz fé no bingo
nem mal a ninguém

tenha bondade
cara autoridade
já é carnaval
permita à vida
ser mais colorida
ali na Avenida Central
advogado vou tratar
e trago um bolo de fubá
pois só me resta
ver passar a festa
sem gingado e sem par

fez do mundo o seu quintal
carnaval na minha dor
prendo os sonhos no varal
secando a ilusão que é o amor

delegado, veja bem
meu marido não sabe de nada
não faz batucada
partido não tem
devoto de Santo Expedito
desperta ao apito
do primeiro trem
batalha sábado e domingo
não faz fé no bingo
nem mal a ninguém

cambaleando por entre vielas
vêm dois foliões
e vêm cantando a Camisa Amarela
antiga aquarela
aos semitons
mas que danado
ohe o delegado
junto da ralé
ai, que bandido
olhe o meu marido
de assunto com outra qualquer

fez da cela o seu quintal
fantasia da prisão
sei o amor é um carnaval
penal é viver de ilusão

A CIGARRA E O CINZEIRO

letra de Fred Sommer inspirada em idéia de Gugu Peixoto (música de Gugu Peixoto, Fred Sommer e Aureo Gandur)

para Maria Gadu


quando a tarde cai cinza assim
e a cigarra enfim desperta lá na Barra
é sinal que a noite há de ser longa

e quando a cinza já não arde, não tem jeito
é que do peito, feito fumaça, o amor se foi

então é um no sarro, uma só farra
onde ancoro meu veleiro
choro um mar sobre o cinzeiro e canto

no cais mais um cigarro e, sem amarras
não demoro em não ter rumo
moro ao léu e fumo, fumo tanto

RANDEVU

diálogo de Fred Sommer e Caio Sóh (música de Fred Sommer)


meu caro poeta
das noites em claro
do vão, da sarjeta
dos dias de luto
teu faro decida
se sirvo ou se paro
mas lembra que a vida
não vale o minuto

não sejam as moças
lá muito pudicas
e nem pouca a vod-
ka, dica de irmão
do fundo da fossa
não passas, quem fica
de touca não pode
cantar meu baião

ó santo poeta
sem rastro e sem manto
sem mastro nem meta
mas só solidão
enquanto o deserto
não seca este pranto
te tenho por perto
de deito nas mãos

não sejam os laços
porém, tua casa
a vodka é tanta
que pode calar
os tempos escassos
e até te dar asas
o triste acalanto
insiste em me achar

poeta melhor
que mude o assunto
e seja mais só
que tu e eu juntos
mais baixo calão
neste randevú
não há, meu irmão
do que eu ou tu
belíssima matéria do Globo Barra desse domingo sobre os (abnegados) artistas do bairro e redondezas! há que se ressaltar, todavia, que a frase atribuída a mim na reportagem, é na verdade de Caio Sóh.

já os olhos azuis na capa são meus! (segredos de fotoshop).